Você costuma mentir para si mesmo?

  • post publicado em 12/02/21 às 14:23 PM
  • Tempo estimado de leitura: 4 minutos

 

O que você acha que aconteceria no seguinte encontro: sua consciência se transformou em uma pessoa e vai aparecer na sua casa para bater um papo com você? O que ela te diria?

Certa vez, li um texto que falava sobre algumas pessoas que pagam caro para ter um mentor em sua vida. Depois que li, confesso que fiquei refletindo e um tanto irritado, me questionando sobre a intenção do autor do texto, pois muitas vezes eu estou nesse papel, e pareceu que as pessoas não deveriam precisar de mentores na vida. Eu tinha achado uma afronta o questionamento do texto.

Depois eu entendi um pouco melhor e consegui chegar em uma conclusão sobre o texto que li. A realidade é que todo ser humano possui uma capacidade intrínseca em si mesmo que nasce com todos nós: a nossa consciência. Para algumas pessoas nossa consciência já vem pronta e nos mostra sempre o caminho que devemos seguir. Para outras pessoas não: depende da atuação de uma “força externa”, para ser internalizada ao longo do tempo, e nos servir futuramente como um guia interior.

A grande verdade é que nossa consciência sempre vai precisar da ação dessa força externa para ser bem formada e se tornar um bom guia interno no futuro. Ao longo da vida, a fonte dessa força externa é sempre multilocalizada, podendo vir de vários “lugares”. E sempre há uma forte ligação entre a força externa e a qualidade do guia interno: se força externa é ruim, o guia interno será igualmente ruim. Se a força é boa, o guia interno será bom. Se a força externa é excelente, o guia interno será excelente.

Quando somos crianças, a nossa consciência tem uma capacidade pobre e fraca de ser nosso guia. Ela nos revela mal que aquilo que queremos fazer pode gerar consequências e problemas sérios e desagradáveis. A boa notícia é que, ao longo da vida, existem três meios fáceis de fortalecimento da capacidade da nossa consciência de ser mais útil e eficaz na hora de nos proteger de alguma coisa realmente perigosa: (1) aprender por experiência vivida, (2) aprender por experiência observada de outros e (3) seguir instruções.

Talvez, o texto que li focou bem mais no terceiro item. No mundo de hoje, todo mundo quer instruir o outro a como fazer alguma coisa. O YouTube se tornou o maior manual de instruções do mundo por ter tutoriais-de-como-fazer-isso-ou-aquilo para praticamente tudo que está contido na existência humana. Digo praticamente tudo, porque lá não se ensina como fabricar sozinho um foguete para você habitar outros planetas, por exemplo. Tudo tem limite, claro.

Os outros dois modos de fortalecimento da consciência acontecem de forma espontânea na vida, sem ter que nos esforçarmos para entrar em contato com eles. Facilmente podemos mudar nosso comportamento, quando andar de bicicleta de forma desatenta, pode significar um belo tombo com “direito” a um joelho ralado e uma sensação de vergonha ou humilhação, se for na frente dos amigos.

Também mudamos com facilidade nosso comportamento, ao observar o outro viver experiências que trazem sofrimento, dor. Quem nunca criou uma lei para si mesmo, dizendo secretamente em sua cabeça: “eu nunca vou fazer igual essa pessoa”? Não é raro encontrar pessoas quem sejam bastante fiéis a esse modelo de aprendizagem por experiências vividas, observadas e instruídas e conseguem moldar o próprio comportamento para colher bons frutos dessa maneira de viver a vida.

Porém, há os que seguem no caminho oposto. Parece que nada ajusta a capacidade da pessoa de saber guiar os próprios passos. O ciclo vicioso de se meter nos mesmos erros parece eterno. É um erro atrás do outro seguindo uma espécie de padrão. A queixa dessas pessoas é de que, em um certo momento, se cansam. Os prejuízos são tantos que elas querem se livrar deles, mas não sabem como. Aqui entra o “mentor”.

A probabilidade da consciência dessa pessoa estar anestesiada, presa, envolvida em uma espécie de torpor é altíssima. Independente dos motivos, é preciso reanimar a consciência dessa pessoa. É praticamente um trabalho médico, mas sem cortes, suturas ou massagens cardíacas diante de uma parada. A reanimação envolve fazer a pessoa entrar em contato com a verdade: a sua verdade subjetiva, e confrontá-la com a realidade da vida. É aqui onde a vida acontece e também o local de reação das pessoas presas no sofrimento: aderir a mudança e ser mais feliz ou fugir dela.

A verdade não deveria “doer”, mas por algum motivo misterioso, ela “dói”. Os seres humanos são criativos em criar motivos falsos para explicar as intenções de suas ações ofensivas, parecendo camaleões que são muito bons de camuflagem. Mesmo que o motivo seja para se proteger dos perigos, a única maneira em que o ser humano se beneficia verdadeiramente para viver uma vida mais feliz, é tendo a capacidade de ser verdadeiro consigo mesmo. Essa capacidade pode não estar bem desenvolvida em muitas pessoas. O mentor faria um bom papel aí.

Como muitos rejeitam a ligação existente entre ser mais feliz e ser verdadeiro consigo mesmo, como consequência também rejeitam a necessidade de ter um mentor na vida delas. Optam por continuam vivendo o ciclo vicioso de quedas repetidas. Quem observa de fora essas pessoas ficam se perguntando: “Será até que ponto ela consegue aguentar?”. E ficam na esperança de que, quando resolverem mudar de decisão e aceitarem ter algum mentor em sua vida, só não seja tarde demais.

E você? Existe algum mentor que te ajuda? Seria sua própria consciência já bem formada ou é alguém que te ajuda a formar melhor sua consciência?

Ms. Guliver Rebouças Nogueira
Psicólogo Clínico e Analista do Comportamento
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Danilo Suassuna
Danilo Suassuna

Pós doutorando em Educação, Psicoterapeuta há quase 20 anos, é psicólogo, mestre e doutor em Psicologia pela PUC-GO. Especialista em Gestalt-terapia pelo ITGT – GO. Foi professor da PUC-GO e do ITGT-GO entre os anos de 2006 e 2011.

É CEO, membro fundador e professor do Instituto Suassuna (IS-GO) e membro do Conselho Consultivo da Revista da Abordagem Gestáltica: Phenomenological Studies (RAG), além de consultor Ad – hoc da Revista em Psicologia em Revista (PUC-Minas).

É autor dos livros: – Histórias da Gestalt – terapia no Brasil – Um estudo historiográfico – Organizador do livro Renadi: a experiência do plantar em Goiânia – Organizador do livro Supervisão em Gestalt-Terapia, bem como autor de artigos na área da Psicologia.