

Saúde mental e bets: o jogo se torna um vício
Subtítulo: O que está em jogo quando jogamos?
A popularização das apostas esportivas no Brasil, conhecidas como “bets”, tem levantado importantes questões sobre seus impactos na saúde mental. Mais do que uma forma de entretenimento, as apostas se tornaram, para muitos, uma armadilha silenciosa que leva à dependência. Mas afinal, quando o jogo deixa de ser lazer e passa a ser um transtorno?
A resposta envolve compreender não apenas o comportamento aparente, mas os mecanismos neuropsicológicos que o sustentam.
O cérebro em jogo: dopamina, recompensa e compulsão
Do ponto de vista da neuropsicologia, o vício em apostas ativa o mesmo circuito de recompensa envolvido em outras dependências, como álcool e drogas. Esse circuito, mediado pela dopamina, neurotransmissor responsável pela sensação de prazer e motivação, é estimulado sempre que a pessoa realiza uma aposta — especialmente quando há um ganho, mesmo que pequeno.
Com o tempo, o cérebro passa a “aprender” que a aposta pode trazer alívio emocional, sensação de controle e expectativa de recompensa. Esse padrão fortalece o comportamento de jogo, criando um ciclo de reforço positivo que pode se tornar difícil de interromper.
Além disso, o fenômeno conhecido como “quase ganho” — quando o jogador quase acerta uma aposta — intensifica ainda mais a excitação, mantendo a esperança e, por consequência, o comportamento compulsivo.
Quando o jogo vira transtorno
O transtorno do jogo, ou jogo patológico, é classificado pela Organização Mundial da Saúde como um transtorno do controle dos impulsos. Caracteriza-se por um padrão persistente de comportamento de aposta que leva à deterioração significativa na vida pessoal, profissional e financeira do indivíduo.
Sinais de alerta incluem:
- Aumento progressivo do tempo e dinheiro gastos em apostas;
- Mentiras para encobrir a atividade;
- Tentativas fracassadas de parar ou reduzir o jogo;
- Apostar para escapar de emoções negativas;
- Comprometimento de relacionamentos e responsabilidades.
Nesses casos, a pessoa já não joga por diversão, mas como uma tentativa disfuncional de lidar com o sofrimento psíquico.
O que está por trás da busca pelo jogo?
É essencial reconhecer que, muitas vezes, a busca incessante pelo jogo não se resume à emoção ou à esperança de lucro. Por trás da compulsão está, frequentemente, um vazio emocional, a necessidade de escapar da realidade ou a ilusão de controle sobre a própria vida. Nesse sentido, a aposta se transforma em um sintoma — um sinal de algo mais profundo que precisa ser compreendido e tratado.
A reflexão sobre o sentido subjetivo que cada pessoa atribui ao jogo é fundamental no processo terapêutico. Por que essa pessoa aposta? O que ela busca ao jogar? A resposta pode revelar muito sobre sua história emocional, frustrações e desejos inconscientes.
Projeto Todos os Cuidados: acolhimento e tratamento
Pensando nessa realidade, o Projeto Todos os Cuidados, iniciativa que reúne profissionais da psicologia, psiquiatria e assistência social, oferece apoio especializado para pessoas com comportamentos aditivos, inclusive apostas. O projeto atua com escuta qualificada, orientação terapêutica e, quando necessário, encaminhamento para redes de saúde e grupos de apoio.
A proposta é acolher sem julgamento, oferecendo cuidado contínuo, especialmente para jovens e adultos impactados por esse tipo de compulsão crescente no país.
Prevenção e responsabilidade social
A regulação do setor de apostas no Brasil precisa avançar, incluindo exigências como campanhas de prevenção, ferramentas de autolimitação nos aplicativos e fiscalização de publicidade dirigida a jovens. Mais do que limitar o acesso, é preciso promover consciência.
As escolas, famílias e mídias também têm um papel crucial ao discutir os riscos associados ao jogo e reforçar estratégias de saúde mental que valorizem o autocuidado, o lazer saudável e a construção de sentido na vida — elementos essenciais para evitar que o jogo se torne a única válvula de escape emocional.
E você, já parou para pensar o que está em jogo quando alguém aposta? Será que é só dinheiro… ou há uma busca emocional por algo mais profundo? Compartilhe sua opinião e participe dessa conversa.