O tema perdas nos remete à história do homem. Do nascimento à morte,
ele vive uma trajetória de experiências de perdas, que impõem desafios
adaptativos, muitas vezes, crivados de sofrimento e dor que habitam uma
dimensão menos física do que emocional.
Diferentes perdas em diversos momentos tomam lugar no cotidiano das pessoas. As perdas são partes da vida. Em qualquer idade, perder é difícil e doloroso. Nossas perdas incluem separações e partidas daqueles que amamos, a perda consciente ou inconsciente de nossos sonhos, de expectativas, de ilusões.
Individualmente, o homem vivencia perdas que provocam ressonâncias
em todos os níveis de seus relacionamentos, considerando as etapas evolutivas do ciclo vital. Vive-se as perdas próprias da infância, da passagem de um tempo de jogos para outra etapa, caracterizada como fase de grande transformação, portanto, de perdas sentidas no corpo e dimensionadas nos papeis psicossociais – a adolescência.
Atingir o status de jovem e depois, de adulto também trazem tarefas
evolutivas que exigem deixar para trás antigas certezas. Os jovens perdem o entusiasmo efervescente, os sonhos impossíveis para dar espaço à existência de um novo tempo, que demanda presteza nos compromissos.
Há ainda outros tipos de perdas no mundo da pessoa adulta: a separação,
a menopausa, a impotência, o aborto, a aposentadoria, a imigração, o envelhecimento. Esta última é umas das mudanças mais difíceis para o ser
humano.
Aceitar as perdas provocadas pela idade, requer uma avaliação do
passado, que envolve aspectos positivos e negativos. Perdas exigem tarefas adaptativas. Perdas causam mal-estar, desconforto, desencadeiam reações no comportamento, causam sofrimento psíquico.
De todas as perdas, a morte de um ente querido representa a mais
avassaladora experiência e, a depender do tipo da morte, a experiência torna-se um estressor catastrófico. Apenas recentemente, a morte tornou-se objeto de interesse dos cientistas sociais, que podem estudá-la sem os desvios das interpretações de natureza sagrada.
Um grande pensador da atualidade, Edgar Morin (1970) refere que: “o
homem ora renuncia a olhar a morte, coloca-a entre parênteses, esquece-a
como se termina esquecendo o sol, ora ao contrário, olha-a com aquele olhar fixo, hipnótico, que se perde no assombro, e do qual nasce as miragens.”
Uma perda por morte modifica a estrutura familiar e, geralmente requer a
reorganização do sistema familiar como um todo. A crise deflagrada por uma morte promove uma desestabilização em todo o sistema familiar, envolvendo os distintos aspectos, dentre eles, a difícil tarefa de renunciar e, a de excluir e incluir novos papéis e personagens na cena familiar.
A dor da perda, como bem refere Worden (1998), não pode ser quantificada e cada indivíduo deve ser compreendido em sua necessidade pessoal, com suas características e reações particulares, assim múltiplos fatores podem definir o rumo do luto individual e familiar.
O reconhecimento compartilhado da realidade da morte e a experiência
comum da perda se dá através da comunicação clara e franca na família. O pacto silencioso pode constituir uma arma defensiva dos membros do sistema familiar para não entrarem em contato com os sentimentos indesejáveis. Sabe-se que, quanto mais importante a pessoa era para a vida da família, quanto mais central seu papel no funcionamento do núcleo familiar, maior será a vivência de perda dos familiares.
A família tem papel fundamental no processo do enlutamento de seus
membros, pode constituir o amparo maior evitando os efeitos característicos de enfermidades mentais.
Nas palavras de Lifton “não existe amor sem perda. E não existe a
superação da perda sem alguma experiência de luto. Não ser capaz de vivenciá-la é ser incapaz de entrar no grande ciclo de vida humano de morte e ressarcimento – ser incapaz, isto é, de viver, novamente”.
Célia Maria Ferreira da Silva Teixeira
Doutora em Psicologia
Psicoterapeuta em situações de perdas, luto e comportamento suicida.
E-mail: psiceliaferreira@gmail.com