Nova jornada de trabalho

  • post publicado em 27/08/25 às 15:02 PM
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Jornadas de 12 horas!

996 e os riscos para a saúde mental e emocional

Essa ideia já foi moda na China, mas, por lá, já parece proibida!

Já nos EUA, que tem uma gana ímpar para a hiperprodutividade, parece que importaram algo extremo!

A chamada jornada 996 — trabalhar das 9h às 21h, seis dias por semana, somando 72 horas semanais — voltou a ganhar espaço em algumas startups do Vale do Silício, especialmente no setor de tecnologia e inteligência artificial. 

O modelo, proibido na China por violar direitos trabalhistas e provocar graves impactos à saúde, é defendido por alguns empreendedores como símbolo de dedicação e produtividade. No entanto, as evidências científicas e os dados de saúde pública mostram outro lado: o alto custo psicológico, emocional e físico para quem se submete a essa rotina.

1. Burnout e esgotamento progressivo

O primeiro risco evidente é o burnout, uma síndrome de exaustão emocional, física e mental reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Jornadas prolongadas levam a uma sobrecarga contínua, na qual a pessoa sente-se drenada, sem energia para lidar com as demandas do trabalho ou da vida pessoal.

Pesquisas indicam que o burnout aumenta proporcionalmente ao número de horas extras trabalhadas. Um estudo global mostrou que a cada acréscimo de 10 horas semanais, os sintomas de depressão aumentam em até 40% e os de ansiedade em 31%. Não se trata apenas de cansaço passageiro, mas de um processo de desgaste estrutural da saúde mental.

2. Ansiedade, depressão e risco de ideação suicida

O impacto da jornada 996 não se limita ao ambiente de trabalho. A OMS e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) já associaram longas jornadas (acima de 55 horas semanais) a doenças cardíacas, acidentes vasculares cerebrais (AVCs) e transtornos mentais graves.

Estudos revelam ainda que jornadas excessivas elevam o risco de depressão e ansiedade a níveis alarmantes, além de contribuírem para o aumento da ideação suicida. Só em 2016, estimou-se que 745 mil mortes em todo o mundo estiveram ligadas ao excesso de trabalho. A vida produtiva deixa de ser fonte de realização e passa a ser uma ameaça à própria existência.

3. Distúrbios do sono e prejuízos cognitivos

O sono é um dos principais afetados pela cultura 996. O corpo humano possui ritmos circadianos que regulam funções como atenção, memória, humor e desempenho. Quando submetido a longos períodos de trabalho, esses ritmos são desorganizados.

A consequência é insônia, sonolência diurna, dificuldade de concentração e lapsos de memória. Estudos mostram que o impacto de trabalhar por anos em ritmos extenuantes pode perdurar até décadas depois, comprometendo a saúde cerebral. Em alguns casos, surge o chamado Shift Work Sleep Disorder (SWSD), caracterizado por insônia crônica e queda drástica de desempenho.

4. Riscos psicossociais e comportamentais

A sobrecarga não atinge apenas a saúde individual. O excesso de trabalho tem efeitos diretos nas relações sociais e familiares. A irritabilidade, a impaciência e a falta de energia minam a convivência e aumentam a probabilidade de conflitos.

Além disso, comportamentos de risco se tornam mais frequentes: sedentarismo, má alimentação, uso abusivo de álcool e outras substâncias. O que começa como “dedicação” ao trabalho pode se transformar em isolamento social, perda de vínculos e fragilização da rede de apoio emocional.

5. O mito do equilíbrio e a vida como fluxo

Muitos discursos sobre saúde mental no trabalho falam em buscar o “equilíbrio” entre vida pessoal e profissional. Mas a verdade é que a vida não é equilibrada. Ela é feita de fluxos, intensidades e instabilidades. Há momentos de maior demanda e outros de retração; fases de urgência e fases de calma.

O problema não está em viver desequilíbrios, mas em se prender a exageros contínuos, quando o excesso se torna regra. O que adoece não é o fluxo, mas a incapacidade de reconhecer pausas, limites e a necessidade de recomposição. Aprender a lidar com esse movimento, em vez de buscar uma falsa simetria, é a chave para uma vida mais saudável e sustentável.

6. Caminhos para lidar com os fluxos sem cair no exagero

Frente a esse cenário, algumas estratégias se tornam fundamentais:

  • Psicoterapia como recurso de saudabilidade: o processo terapêutico auxilia a identificar padrões de autoexigência, compreender pressões externas e ressignificar a ideia de produtividade.
  • Construção de um projeto de vida saudável: não se trata de buscar equilíbrio estático, mas de desenvolver um projeto que inclua tanto períodos de intensidade quanto espaços de pausa, de modo que nenhum extremo domine a vida.
  • Reconhecimento dos sinais de alarme: irritabilidade constante, insônia persistente, queda no desempenho e sentimentos de desesperança não devem ser naturalizados. São convites ao cuidado profissional.
  • Valorização do tempo de recomposição: respeitar os momentos de descanso, convívio social e lazer não é luxo, é parte essencial de uma trajetória de vida que se mantém viável a longo prazo.

Todos Cuidados: terapia como forma de vida

O Projeto Todos Cuidados, do Instituto Suassuna, é uma proposta concreta de saudabilidade e projeto de vida. Mais do que um espaço de psicoterapia acessível, ele representa a ideia de que cuidar da mente é parte integrante da existência — não apenas em momentos de crise, mas como prática contínua de viver melhor.

A vida não será equilibrada, e não precisa ser. Mas pode ser vivida com consciência, saúde emocional e sentido, desde que saibamos lidar com os fluxos sem cair em exageros destrutivos. Nesse caminho, a terapia é aliada fundamental para sustentar o viver com presença e dignidade.

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Danilo Suassuna
Danilo Suassuna

Dr. Danilo Suassuna Martins Costa CRP 09/3697 CEO do Instituto suassuna, membro fundador e professor do Instituto Suassuna ; Psicoterapeuta há quase 20 anos, é psicólogo, mestre e doutor em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás(PUC-GO);

Especialista em Gestalt-terapia, Doutor e Mestre em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (2008) possui graduação em Psicologia pela mesma instituição. Pós-Doutorando em Educação;

Autor dos livros:

  • Histórias da Gestalt-Terapia – Um Estudo Historiográfico;
  • Renadi - Rede de atenção a pessoa idosa;
  • Supervisão em Gestalt-Terapia; Teoria e Prática;
  • Supervisão em Gestalt-Terapia: O cuidado como figura;

Organizador do livro Supervisão em Gestaltt-Terapia, bem como autor de artigos na área da Psicologia; Professor na FacCidade.

Acesse o Lattes: http://lattes.cnpq.br/8022252527245527

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