Depressão: qual o tamanho do problema

  • post publicado em 15/12/25 às 14:50 PM
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Depressão: qual o tamanho do problema e o que sabemos sobre o fim de ano?

  1. Depressão

1.1. Brasil – prevalência geral

Os dados mais robustos vêm da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS):

  • Em 2013, a prevalência de depressão autorreferida foi de 7,6% dos adultos brasileiros.(SciELO Brasil)
  • Em 2019, essa prevalência subiu para 10,2% (IC95% 9,9–10,6).(SciELO Brasil)
  • Quando se usa o PHQ-9 (triagem de sintomas depressivos), a prevalência de “triagem positiva” para depressão aumentou de 7,9% (2013) para 10,8% (2019).(SciELO)
  • Um estudo recente com os mesmos dados da PNS 2019 estimou a prevalência de depressão em 10,27% (cerca de 16,3 milhões de adultos).(PMC)

Ou seja, cerca de 1 em cada 10 adultos brasileiros apresenta depressão — e esse número vem crescendo.

Um outro trabalho, também com dados nacionais, encontrou prevalência de 9,9% de depressão diagnosticada na população brasileira, associada a ser mulher, 30–59 anos, divorciada, etc.(UniCesumar)

1.2. Depressão especificamente no fim do ano

Aqui entra a primeira limitação importante de dizer explicitamente “índice de depressão no fim do ano”:

  • As grandes pesquisas não estratificam por mês/estação.
  • O que temos são dados anuais de prevalência e estudos clínicos/epidemiológicos mostrando agravamento de sintomas em certos períodos (como festas, luto, datas significativas), mas nem sempre com recorte “dezembro/janeiro”.

Na literatura internacional, há evidências de:

  • Aumento de estresse, sintomas ansiosos e depressivos no período de festas em pessoas com vulnerabilidades prévias (luto recente, solidão, conflitos familiares, dificuldades financeiras).
  • Contudo, isso não se traduz necessariamente em aumento proporcional de diagnósticos ou de suicídio no mês de dezembro (vamos ver na parte de suicídio).

Para este estudo, vale deixar claro:

“No Brasil, aproximadamente 10–11% dos adultos apresentam depressão, segundo a PNS 2019.(SciELO) Embora não haja dados nacionais estratificados que mostrem aumento da prevalência diagnóstica especificamente nos meses de fim de ano, diversos estudos apontam que o período de festas pode intensificar sintomas em pessoas já vulneráveis, sobretudo pela combinação de cobranças sociais, balanços de vida, conflitos familiares e solidão.”

2. Solidão e fim de ano: o que os números mostram

Aqui os dados mais consistentes vêm de outros países, mas ajudam a compor o quadro:

2.1. Solidão crônica (dados anuais)

  • No Reino Unido, estimativas recentes indicam que cerca de 5,3 milhões de pessoas vivem com solidão crônica, algo em torno de 11% da população adulta.(PBE)
  • A solidão prolongada tem sido associada a risco aumentado de depressão, ansiedade, pior prognóstico em doenças físicas e maior mortalidade.

2.2. Fim do ano como gatilho de solidão

Alguns dados específicos de “Natal/fim de ano”:

  • A Canadian Mental Health Association reporta que mais da metade dos canadenses relata ansiedade, depressão e solidão durante a temporada de festas.(firstsession.com)
  • Um estudo do Policy Institute (King’s College London) mostrou um aumento significativo em jovens adultos (21–34 anos) passando o Natal sozinhos no Reino Unido: de 1% em 1969 para quase 9% em 2024. No total, a proporção de pessoas passando o Natal sozinhas subiu de 5% para 11% ao longo de 55 anos. Entre idosos 65+, cerca de 15% passam o dia sozinhos — índice estável historicamente.(The Guardian)

Esses dados sugerem que:

  • Solidão e isolamento social no Natal e Ano Novo estão aumentando em algumas populações, especialmente jovens adultos e idosos.
  • O “roteiro social” de que todos deveriam estar felizes, em família, em clima de abundância, amplia o contraste para quem está só, enlutado, endividado ou em conflito — o que pode agravar sofrimento psíquico, ainda que não se traduza automaticamente em aumento de suicídio.

Vale ressaltar que estudos de países como Canadá e Reino Unido mostram que mais de 50% das pessoas relatam ansiedade, depressão e solidão nas festas de fim de ano, (firstsession.com) e que a proporção de pessoas passando o Natal sozinhas praticamente dobrou em 50 anos, chegando a cerca de 11% da população em alguns levantamentos.(The Guardian) Esses dados reforçam a hipótese de que o fim do ano é um período de maior exposição ao sentimento de solidão, ainda que isso não signifique, necessariamente, um pico estatístico de suicídios.”

3. Suicídio no fim do ano: mito x evidência

Aqui é onde os dados são muito claros em desmontar um mito importante.

3.1. Mito do “pico de suicídio no Natal”

Análises de dados do CDC (EUA), compiladas por centros como o Annenberg Public Policy Center, mostram que:

  • Os meses com menor taxa média diária de suicídio costumam ser novembro, dezembro e janeiro.(annenbergpublicpolicycenter.org)
  • Em 2023, por exemplo, dezembro foi o mês com menor taxa média diária de suicídios (12º lugar entre os meses), enquanto julho e agosto concentraram as maiores taxas.(annenbergpublicpolicycenter.org)

Vários estudos e revisões recentes reforçam que a ideia de que “suicídio aumenta no Natal” é um mito persistente, frequentemente alimentado pela mídia, mas não sustentado pelos dados.(asc.upenn.edu)

3.2. Padrões sazonais em outros contextos (incluindo hemisfério sul)

Ao mesmo tempo, alguns estudos em países de clima mais quente ou no hemisfério sul mostram um padrão diferente:

  • Um estudo em um estado do sul do Brasil (Rio Grande do Sul), analisando suicídios entre 2015 e 2019 (6.287 casos), encontrou que:
    • Homens tiveram pico de suicídio em janeiro e dezembro.
    • Mulheres tiveram pico em março e dezembro.(SciELO)
  • Um estudo clássico de variação sazonal em país sul-americano (com clima temperado) mostrou que:
    • Os meses “quentes” (outubro–janeiro) concentraram cerca de 39% dos suicídios, enquanto os meses “frias” responderam por 28,7%.
    • Dezembro teve a maior proporção de suicídios do ano (10,9%), e junho a menor (7%).(SciELO)

Isso indica que:

  • Padrões sazonais existem, mas não são universais.
  • Em muitos países (EUA, Europa), o pico ocorre na primavera/verão, não em dezembro.(annenbergpublicpolicycenter.org)
  • Em alguns contextos do hemisfério sul, dezembro aparece como mês de maior incidência, mas provavelmente mais relacionado a temperatura, luminosidade, dinâmicas sociais e fatores culturais do que ao “Natal” em si.

3.3. Brasil – níveis gerais de suicídio

  • A taxa média de mortalidade por suicídio no Brasil em 2010–2014 foi de cerca de 5,23 por 100 mil habitantes, considerada relativamente baixa em comparação com muitos países.(Jornal Brasileiro de Psiquiatria)
  • Estudos mais recentes mostram tendência de aumento nas taxas de suicídio no país, incluindo entre trabalhadores.(valuehealthregionalissues.com)

Em termos de “índice no fim do ano”, o que sepode afirmar com segurança é:

“Em termos globais, os meses de fim de ano (novembro, dezembro, janeiro) não são, em geral, aqueles com maior taxa de suicídio, e em vários países, até aparecem entre os meses com menor incidência. (annenbergpublicpolicycenter.org). Em algumas regiões do hemisfério sul e climas mais quentes, porém, dezembro aparece como mês de pico em determinados recortes, o que sugere um padrão sazonal complexo, influenciado por fatores climáticos e socioculturais, mais do que pelo Natal em si.”(SciELO)

4. Organizando

Pode-se, a partir da literatura, assumir que:

IndicadorNível anual (dados recentes)Evidência específica no fim do ano (Nov–Jan)
Depressão (Brasil)10–11% de adultos com depressão (PNS 2019, PHQ-9 e autorrelato).(SciELO)Sem dados nacionais por mês; literatura clínica e relatos qualitativos sugerem intensificação de sintomas em pessoas vulneráveis no período de festas (balanço de vida, conflitos familiares, luto, dívidas).
Solidão (geral)11% de adultos com solidão crônica em alguns países (ex.: Reino Unido).(PBE)Mais de 50% dos canadenses relatam ansiedade, depressão e solidão nas festas.(firstsession.com) Até 11% das pessoas passam o Natal sozinhas em alguns levantamentos no Reino Unido, com aumento ao longo das décadas.(The Guardian)
Suicídio (global/CDC)Taxas variam por país; no Brasil, em torno de 5,2/100 mil (2010–2014), com tendência de aumento recente.(Jornal Brasileiro de Psiquiatria)Nos EUA e outros países, os meses com menor taxa são novembro, dezembro e janeiro; dezembro frequentemente é o menor do ano.(annenbergpublicpolicycenter.org) Em parte do hemisfério sul, alguns estudos apontam pico em dezembro, mas associado a padrões sazonais locais.(SciELO)

5. Síntese interpretativa

Você pode amarrar os dados, em linguagem de artigo, nessa linha (adaptável):

  • Depressão: cerca de 1 em cada 10 adultos no Brasil vive com depressão, com crescimento significativo entre 2013 e 2019, sobretudo entre jovens adultos e populações socioeconomicamente vulneráveis.(SciELO)
  • Solidão: dados de países como Reino Unido e Canadá mostram aumento de solidão crônica e de pessoas passando o Natal sozinhas, além de mais da metade da população relatando sofrimento emocional (ansiedade, tristeza, solidão) no período de festas.(PBE)
  • Suicídio: embora a percepção social e midiática associe o fim do ano a um “pico de suicídios”, as séries temporais mostram que, em muitos países, as menores taxas médias diárias ocorrem justamente entre novembro e janeiro.(asc.upenn.edu) Em algumas regiões do hemisfério sul, dezembro aparece como mês de maior incidência, sugerindo um padrão sazonal associado ao clima e outros fatores locais.(SciELO)

Isso te permite sustentar uma tese interessante:

O fim de ano não é necessariamente o período com maior número absoluto de suicídios, mas é um período de alta densidade simbólica e emocional, marcado por expectativas de felicidade, balanços de vida, encontros familiares e comparações sociais (especialmente nas redes). Esse cenário aumenta estresse subjetivo, solidão percebida e reativação de lutos, podendo agravar quadros depressivos já existentes e demandar maior atenção em termos de prevenção e cuidado.

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Danilo Suassuna
Danilo Suassuna

Dr. Danilo Suassuna Martins Costa CRP 09/3697 CEO do Instituto suassuna, membro fundador e professor do Instituto Suassuna ; Psicoterapeuta há quase 20 anos, é psicólogo, mestre e doutor em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás(PUC-GO);

Especialista em Gestalt-terapia, Doutor e Mestre em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (2008) possui graduação em Psicologia pela mesma instituição. Pós-Doutorando em Educação;

Autor dos livros:

  • Histórias da Gestalt-Terapia – Um Estudo Historiográfico;
  • Renadi - Rede de atenção a pessoa idosa;
  • Supervisão em Gestalt-Terapia; Teoria e Prática;
  • Supervisão em Gestalt-Terapia: O cuidado como figura;

Organizador do livro Supervisão em Gestaltt-Terapia, bem como autor de artigos na área da Psicologia; Professor na FacCidade.

Acesse o Lattes: http://lattes.cnpq.br/8022252527245527