Ansiedade para pais

  • post publicado em 02/12/25 às 15:15 PM
  • Tempo estimado de leitura: 4 minutos

 

Ansiedade do meu filho!

Ansiedade infantil sob a ótica da Gestalt-terapia: o que o comportamento do seu filho está tentando dizer

(Versão longa, profunda e baseada em evidências)

1. A verdade dura: muitas crianças ansiosas são vistas como “birrentas”, “teimosas” ou “inseguras”

A ansiedade infantil raramente aparece com a frase: “mamãe, estou ansioso”.

Ela aparece no corpo, no comportamento, na rotina, no sono, no desempenho escolar, no humor.

E, na maioria das vezes, pais interpretam esses sinais como:

  • “manha”,
  • “falta de limites”,
  • “preguiça”,
  • “drama”,
  • “sensibilidade demais”.

Mas a ciência é clara: crianças sentem ansiedade antes de conseguir nomeá-la.

Winnicott lembrava que:

“A criança não tem um self pronto para lidar sozinha com experiências intensas; ela precisa de um ambiente que a ajude a dar forma ao que sente.”

— Winnicott, 1965

E esse é exatamente o ponto central deste texto:

o que chamamos de ‘dificuldade’ muitas vezes é um pedido de ajuda que o seu filho não sabe colocar em palavras.

2. O que é ansiedade para a Gestalt-terapia? Uma explicação que faz sentido para pais

Ao contrário do senso comum — que chama ansiedade de “nervosismo” —, a Gestalt-terapia explica ansiedade como algo muito mais profundo.

Fritz Perls, fundador da abordagem, afirmava:

“Ansiedade é a lacuna entre o agora e o depois.”

— Perls, 1969

Ou seja: seu filho está vivendo no futuro, imaginando o que pode dar errado, sentindo medo antes mesmo do perigo chegar.

Isso gera:

  • dor de barriga,
  • irritabilidade,
  • dificuldade de concentração,
  • crises de choro,
  • medo de errar,
  • apego exagerado aos pais,
  • comportamentos de fuga ou evitação,
  • dificuldade de comer ou dormir.

Margherita Spagnuolo Lobb, uma das maiores referências em Gestalt-terapia, resume assim:

“A ansiedade é uma tentativa de cuidar de si quando o ambiente parece imprevisível.”

— Spagnuolo Lobb, 2018

A criança não está desobedecendo — ela está tentando sobreviver emocionalmente.

3. O corpo fala antes da boca: ansiedade infantil é corporal

Crianças não dizem:

“estou ruminando pensamentos antecipatórios e isso está desregulando meu sistema nervoso autônomo.”

Elas dizem:

  • “tô com dor de barriga”,
  • “não quero ir”,
  • “tô com medo”,
  • “não consigo dormir”,
  • “fica comigo?”,
  • “posso faltar?”.

E o corpo delas está dizendo exatamente aquilo que a Gestalt-terapia afirma há décadas:

“O corpo sabe antes da mente compreender.”

— Perls, 1969

A ciência confirma isso. Pesquisas sobre interocepção mostram que crianças ansiosas têm maior ativação da amígdala e do sistema de alerta (Farb, 2023; LeDoux, 2020).

O corpo dispara antes da criança entender o que está acontecendo.

4. Por que crianças estão tão ansiosas hoje? O papel do campo familiar e social

A Gestalt-terapia insiste em um ponto essencial para pais:

“A ansiedade não está na criança; está no campo em que ela vive.”

— Yontef, 1993

Alguns fatores do campo atual que aumentam ansiedade infantil:

1. Excesso de estímulos e agendas lotadas

A criança não tem tempo de “existir”.

2. Expectativas elevadas

Desempenho, autocontrole precoce, maturidade acima do possível.

3. Falta de previsibilidade

Rotinas instáveis deixam o organismo infantil em estado de alerta.

4. Conflitos, brigas e tensões em casa

A criança absorve tudo.

5. Comparação social constante

“O filho do outro aprende mais rápido.”

“Fulano é melhor na escola.”

“Olha o que aquela criança consegue fazer.”

6. Exposição precoce a telas

Aumenta a excitabilidade do sistema nervoso e diminui capacidade de autorregulação.

Spagnuolo Lobb (2021) chama essa época de “sociedade hiperexcitada”, onde o ritmo do mundo é maior do que a capacidade de processamento da criança.

5. Ansiedade não é fraqueza: é um pedido de suporte

Zachello afirma que:

“O sintoma é uma solução criativa quando o campo não oferece outro recurso.”

— Zachello, 2004

A criança ansiosa não é fraca.

Ela é criativa: está tentando se proteger.

Muitas vezes, proteger-se de:

  • rejeição,
  • erro,
  • exposição,
  • turbulências emocionais dos adultos,
  • conflitos,
  • exigências irreais.

A ansiedade é, então, aquilo que Perls chama de “tentativa de ajuste”.

6. Como a ansiedade aparece na fronteira de contato da criança?

A criança ansiosa pode:

1. Retroflexionar

Fazer para si o que não consegue expressar para o mundo.

Ex.: morder unhas, prender respiração, tensionar o corpo.

2. Projetar

Achar que todos vão rir dela, criticá-la, rejeitá-la.

3. Introjetar

Frases como:

  • “tenho que ser perfeito”,
  • “não posso errar”,
  • “mamãe fica triste se eu não fizer certo”.

4. Confluir

Fundir-se ao desejo dos outros e perder o próprio.

Zinker explica:

“Crianças ansiosas vivem com fronteiras rígidas ou dissolvidas demais.”

— Zinker, 1977

7. O que os pais podem fazer? A resposta da Gestalt-terapia

A Gestalt não oferece “técnicas milagrosas”, mas oferece presença, ritmo, suporte e contato.

E pais podem usar esses princípios imediatamente.

7.1. Dê nome ao que seu filho sente

Nomear emoções cria organização.

Winnicott dizia:

“Quando a mãe dá nome ao que a criança sente, ela dá existência ao self.”

Ex.:

“Parece que você ficou com medo daquela situação.”

“Percebi que seu corpo ficou tenso.”

7.2. Reduza a velocidade do ambiente

A criança ansiosa precisa de previsibilidade corporal e emocional.

7.3. Seja o porto seguro, não o fiscal

A pergunta nunca é:

“Por que você está assim?”

Mas sim:

“O que você precisa agora?”

7.4. Ensine seu filho a voltar ao corpo

Respiração, pés no chão, sentir o corpo apoiado.

7.5. Não minimize, não compare, não critique

Frases como:

  • “para com isso”,
  • “isso é besteira”,
  • “seu primo consegue”,

aumentam ansiedade.

7.6. Procure ajuda quando os sinais estiverem muito intensos

Danilo Suassuna, como psicólogo, sempre lembra que:

“Ansiedade infantil não é frescura: é um pedido de reorganização que merece cuidado profissional.”

8. Como a Gestalt-terapia ajuda crianças ansiosas na clínica?

1. Awareness (consciência)

A criança aprende a perceber o que sente no corpo.

2. Experimentos lúdicos

Desenhos, histórias, figuras, metáforas.

3. Ritmo relacional

O terapeuta regula a excitação.

4. Contato seguro

A criança precisa sentir que existe um lugar onde pode ser inteira.

Spagnuolo Lobb diz:

“O terapeuta reencontra o ritmo perdido da criança.”

— Spagnuolo Lobb, 2013

9. A mensagem final para pais: ansiedade não some com bronca — ela diminui com presença

A criança ansiosa não quer dar trabalho.

Ela quer ser compreendida.

Ela precisa de pais que consigam olhar além do comportamento, além da irritação, além da teimosia aparente.

Como Perls dizia:

“Não busque eliminar o sintoma; busque restaurar a pessoa.”

— Perls, 1969

E como Danilo Suassuna ressalta no projeto Falar para seu Filho Ouvir:

“A ansiedade do seu filho não pede perfeição: pede presença, ritmo e vínculo.”

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Danilo Suassuna
Danilo Suassuna

Dr. Danilo Suassuna Martins Costa CRP 09/3697 CEO do Instituto suassuna, membro fundador e professor do Instituto Suassuna ; Psicoterapeuta há quase 20 anos, é psicólogo, mestre e doutor em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás(PUC-GO);

Especialista em Gestalt-terapia, Doutor e Mestre em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (2008) possui graduação em Psicologia pela mesma instituição. Pós-Doutorando em Educação;

Autor dos livros:

  • Histórias da Gestalt-Terapia – Um Estudo Historiográfico;
  • Renadi - Rede de atenção a pessoa idosa;
  • Supervisão em Gestalt-Terapia; Teoria e Prática;
  • Supervisão em Gestalt-Terapia: O cuidado como figura;

Organizador do livro Supervisão em Gestaltt-Terapia, bem como autor de artigos na área da Psicologia; Professor na FacCidade.

Acesse o Lattes: http://lattes.cnpq.br/8022252527245527

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