A necessidade de dizer e o desafio de “realmente escutar”

  • 17 ago

Dezoito meses de pandemia… O quanto há para se dizer sobre o que se passou nesses últimos tempos? Dores engasgadas, despedidas às pressas, acúmulo de trabalho e vários eteceteras. Se não conseguimos dizer sobre tudo isso que nos afeta, isso nos afetará de muitas maneiras. Com o empobrecimento das nossas formas de comunicação – cada vez mais dizemos coisas através de dancinhas, frases curtíssimas e imagens chapadas num processo quase industrial – menos comunicamos o essencial e o que realmente nos condiciona.

Há um preço para cada silêncio e um silêncio em cada reels ou tik toks. Estamos amalgamados em vender nossa imagem para um Outro, na esperança de que ele nos imponha um preço e diga o quanto vale (por meio de curtidas ou reais) a nossa exposição – mal ou bem sucedida – definida por quanto ela será abatida pela fiscalização de quem define o quanto vale o sorriso falso estampado no meu feed.

Mas o que quero enfatizar perpassa pela outra margem: a nossa escuta também se empobreceu? Escutamos os gestos, as palavras, os silêncios que gritam numa rica polifonia ao nosso redor? Em cursos de Psicologia, em cursos de coach, em Medicina,…, temos a paciência para desdobrar os dizeres que estão nos detalhes. Penso, por exemplo, nas ênfases em cada fonema que as pessoas sem perceber entoam como numa canção. Alguém narcísico fala com prazer seu próprio nome, alguém metódico ordena suas consoantes e preposições, outro expansivo canta suas consoantes com prazer e invade os ouvidos dos incautos que escutam por tabela.

Enfim, fica essa pergunta de quem vos digita: o que escutamos quando ouvimos alguém? Escutamos a nós mesmo por não conseguir parar para ouvir o outro? Escutamos os clichês cotidianos por estarmos acostumados sempre ao mesmo? Escutamos as fortes cores de uma sociedade de espetáculo? Escutamos as pinceladas ausentes de uma pintura que não está dada de início? Escutamos o fake das novidades? Escutamos as moedas afetivas e likes motivacionais que vibram no celular?…. Sei lá… Psicanálise é uma arte esquisita…

Texto: Prof João Camilo

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