

5 dicas para uma gravidez emocionalmente saudável
A gravidez é uma travessia: entre a mulher que se era e a mãe que se está se tornando. Ela atravessa o corpo, mas também a psique, os vínculos e a história pessoal de cada mulher. Ainda que o discurso social insista em romantizar a gestação como um tempo de plenitude e realização, a psicologia perinatal — sustentada por décadas de pesquisa clínica e científica — sabe que a gravidez também pode ser ambígua, solitária e angustiante.
Por isso, falar em gravidez emocionalmente saudável não é o mesmo que falar em “gravidez perfeita” ou “sem sofrimento”. Saúde emocional não é ausência de dor, mas a possibilidade de reconhecer, nomear, elaborar e sustentar os afetos que emergem nesse período tão transformador.
A seguir, apresento 5 dicas fundamentadas na psicologia do desenvolvimento, perinatal e da parentalidade, que podem ajudar a construir uma gravidez mais consciente, autêntica e emocionalmente cuidada.
Escute o que você sente — mesmo que não seja “bonito”
Culturalmente, espera-se que a mulher grávida esteja sempre sorridente, serena, grata. Mas a realidade afetiva da gestação é muito mais complexa. Sentimentos como medo, raiva, confusão, tristeza ou dúvida são frequentes — e absolutamente legítimos.
Segundo Geneviève Bydlowski (2004), psiquiatra francesa que estudou a experiência psíquica da gravidez, esse período é marcado por uma reativação de conteúdos inconscientes, especialmente ligados à própria infância da mulher, à sua relação com a mãe e à história dos vínculos anteriores. Por isso, o que se sente na gravidez não é apenas “hormônio” — é história viva se reorganizando.
Negar essas emoções em nome de uma imagem idealizada de “mãe plena” só aumenta o sofrimento e dificulta o vínculo com o bebê. Escutar-se com honestidade — e sem julgamento — é o primeiro passo para uma gestação emocionalmente saudável.
Exercício sugerido: mantenha um diário emocional da gestação. Escreva, sem censura, o que sente. Nomear o indizível é uma forma de construir saúde psíquica.
Permita-se mudar de ideia sobre o que é ser mãe
Muitas mulheres chegam à gestação com uma ideia formada sobre a maternidade: seja por idealização, seja por experiências anteriores, seja por pressões familiares ou culturais. Porém, a experiência real frequentemente desorganiza essas certezas. E isso é bom.
Joan Raphael-Leff (2001), em sua teoria sobre os processos psicológicos da maternidade, propõe que a mulher atravessa uma reconfiguração interna que exige tempo, espaço e elasticidade emocional. Ela precisa renegociar suas crenças, seus papéis e seu lugar no mundo.
Isso significa que não há problema algum em sentir-se insegura, em rever decisões, em redimensionar expectativas. A saúde emocional na gravidez exige flexibilidade psíquica para abandonar velhos modelos e abrir espaço para uma maternidade possível — e não idealizada.
Importante: mudar de ideia, sentir-se dividida ou confusa não é sinal de fragilidade, mas de amadurecimento.
Cerque-se de pessoas que validem, não que cobrem
A maternidade é um campo de disputas simbólicas: todos parecem saber o que é melhor para o bebê — menos a própria mulher. Durante a gestação, muitas mães se veem cercadas de conselhos, palpites e julgamentos, nem sempre bem-vindos.
Para construir uma gestação emocionalmente saudável, é fundamental cuidar da rede de apoio emocional. Mais do que pessoas disponíveis, é preciso ter por perto pessoas que saibam escutar sem corrigir, acolher sem invadir, acompanhar sem impor.
Donald Winnicott (1956) afirma que o ambiente facilitador — aquele que sustenta emocionalmente a mulher durante a gestação e o puerpério — é essencial para que ela desenvolva a capacidade de cuidar do bebê. Nenhuma mulher nasce sabendo ser mãe. Ela precisa ser sustentada para sustentar.
Dica prática: se possível, combine com um(a) amigo(a), parceira(o) ou familiar uma “escuta semanal” — um momento em que você possa falar sobre seus sentimentos sem interrupções ou julgamentos.
Busque espaços de escuta profissional
A psicologia perinatal existe para isso: para acolher as transformações psíquicas da gravidez com escuta técnica, ética e sensível. O psicólogo perinatal não está ali para julgar decisões, corrigir comportamentos ou apontar defeitos. Ele está ali para ajudar a mulher a reconhecer o que sente, sustentar o que a atravessa e transformar o sofrimento em narrativa.
Daniel Stern (1997) descreve a gestação como um tempo de “constelação da maternidade”, em que os temas da identidade, do cuidado, da autonomia e da herança emocional se reconfiguram. Ter um espaço terapêutico nesse período pode ajudar a:
- Elaborar lutos não reconhecidos (de uma gestação anterior, de um parto que não foi como o esperado, de um vínculo idealizado que não se realizou);
- Construir segurança psíquica para o vínculo com o bebê real (e não com o bebê ideal);
- Reorganizar a imagem de si como mulher e futura mãe.
Importante: não é preciso estar “adoecida” para procurar ajuda psicológica. Prevenção também é cuidado.
Lembre-se: saúde emocional também é saúde pré-natal
Fala-se muito em pré-natal clínico, exames, alimentação, atividade física. Tudo isso é essencial. Mas a saúde mental da gestante ainda é pouco falada, pouco rastreada, pouco cuidada.
No entanto, estudos mostram que o sofrimento psíquico durante a gestação pode afetar o vínculo mãe-bebê, a qualidade do parto, a amamentação e até mesmo o desenvolvimento emocional da criança (Glover, 2014; WHO, 2018). Não para culpabilizar a mulher, mas para ampliar o cuidado.
Uma gravidez emocionalmente saudável não depende de controle absoluto sobre os sentimentos, mas de um ambiente onde a mulher possa ser inteira: com suas forças e suas fragilidades. Onde ela possa pedir ajuda sem ser julgada. Onde ela possa ser cuidada para, então, cuidar.
A saúde da mãe é também a saúde do bebê. E isso começa — literalmente — na escuta.
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Criado pelos psicólogos Dr. Danilo Suassuna e Karla Cerávolog, o projeto é um espaço de orientação, escuta e construção de vínculos saudáveis com base na psicologia do desenvolvimento, da infância e da parentalidade.
Rede integrada de cuidado que acompanha a mulher, o bebê e a família desde a gestação até a infância, oferecendo ações educativas, formações, acolhimento psicológico e conteúdos dedicados ao cuidado desde o início da vida.
Porque falar para seu filho ouvir começa com aprender a escutar — a si mesma.
Referências
- Bydlowski, G. (2004). La dette de vie: Études psychanalytiques sur la maternité. Paris: PUF.
- Glover, V. (2014). Maternal depression, anxiety and stress during pregnancy and child outcome; what needs to be done. Best Practice & Research Clinical Obstetrics & Gynaecology, 28(1), 25–35.
- Raphael-Leff, J. (2001). Psychological Processes of Childbearing. London: Chapman & Hall.
- Stern, D. N. (1997). A constelação da maternidade: O panorama da psicoterapia mãe-bebê. Porto Alegre: Artmed.
- WHO – World Health Organization. (2018). Maternal mental health and child health and development in low and middle-income countries: Report of the meeting. Geneva: WHO.
- Winnicott, D. W. (1956). Primary maternal preoccupation. In: Collected Papers. London: Tavistock.
Por
Danilo Suassuna CRP 09/3697
Karla Cerávolo CRP 09/10088