O AUTISMO NUMA PERSPECTIVA HUMANISTA: UMA ABERTURA PARA O OUTRO

  • post publicado em 07/11/21 às 10:30 AM
  • Tempo estimado de leitura: 13 minutos

 

Minha confiança é no processo pelo qual a verdade é descoberta, alcançada
e aproximada. Não é uma confiança na verdade já conhecida ou formulada
(Carl Ransom Rogers)

 

Este artigo pretende compreender o quadro diagnosticado de autismo em uma diferente perspectiva, considerando os aspectos afetivo-emocionais no desenvolvimento humano e aplicando estes princípios numa Instituição em Barbacena/MG. Reflete, ainda, a respeito de como ajudar estas pessoas a encontrarem novas possibilidades de crescimento e melhores condições relacionais.

 

A visão que será apresentada é nova, pouco divulgada, e, não menos, polêmica, mas, considerando que não existe uma origem definida para o autismo, sentimo-nos à vontade para dizer de nossa crença e conseqüente “tese”. Como observa Mary Midgley (1991), ‘’julgar não é, em geral, simplesmente aceitar uma, dentre outras alternativas já prontas, como a certa. Isso não pode ser feito através do cara e coroa, mas implica buscar uma razão para pensar e agir de certo modo. É uma função compreensiva, que envolve nossa natureza global e pela qual nos guiamos e achamos nosso caminho em meio a toda uma floresta de possibilidades. Não há regras científicas aqui; não há um sistema de fatos, previamente dados, que mapeará todo o caminho, para nós. Estamos sempre nos movendo na direção de territórios novos’’.

Pensamos ser importante dizer de como esse diagnóstico é definido pela prática médica contrapondo com uma visão humanista, mais precisamente a da Abordagem Centrada na Pessoa idealizada por Carl Rogers.

De acordo com a Psiquiatria Médica, o autismo é uma inadequação no desenvolvimento que tem início em crianças até os três anos de idade e se manifesta por toda a vida. É incapacitante, com graves distúrbios emocionais (psíquicos), levando o indivíduo a um isolamento, ou seja, um distanciamento do mundo e das pessoas, resultando em uma falta de comunicação. Nesses indivíduos, a atenção é focalizada, quase sempre, em ritmos e sensações corporais, ou seja, a criança é muito 2 voltada para si mesma, não reconhecendo a existência de um outro ou de uma vida social. A maioria dos indivíduos autistas carece de espontaneidade, iniciativa e criatividade na organização de seu tempo de lazer e tem dificuldade em aplicar conceitualizações em decisões no trabalho (CID-10. 1993), porém, não envolve prejuízo qualitativo na interação social nem restrição na gama de interesses e comportamentos. O transtorno da linguagem não é diagnosticado se os critérios forem satisfeitos para o transtorno global do desenvolvimento. Seu mutismo é caracterizado por falta de habilidades sociais normais em certas situações (DSM-IV-TR. 2004).

Apostamos que o autismo não se trata simplesmente de um ‘’problema’’ patológico, mas sim de relação. Carl Rogers, psicólogo norte-americano criador da Abordagem Centrada na Pessoa, considera um princípio básico, chamado de tendência atualizante, que se aplica a todos seres humanos, inclusive àqueles que estão psicologicamente adoecidos. Nas palavras de Lobo (1996) essa proposição se traduz na crença de que qualquer ser humano carrega em sua própria natureza, em potencial, a capacidade de se reconhecer e de compreender a si mesmo, bem como a possibilidade de interagir com seu meio ambiente, de modo suficiente, para alcançar a sua satisfação e a eficácia necessária ao seu desenvolvimento e ao seu funcionamento adequados. Este conceito foi o que sustentou a nossa crença de que as crianças poderiam sair da condição de pobreza relacional-afetiva em que se encontravam.

Ainda de acordo com Lobo (1996), para que essa possibilidade torne-se realidade, é imprescindível que o indivíduo possa vivenciar um relacionamento humano caloroso e verdadeiro, em que ele tenha um significado pessoal, seja objeto de um investimento afetivo e encontre um clima de segurança e intimidade, tanto física, quanto psicológica. É fundamental, ainda, que no seu processo de socialização, ele possa ser introduzido na dimensão simbólica, através de sua iniciação à linguagem.

A mãe que for capaz de permitir a entrada do pai, na relação com o filho, e de suportar esses ensaios iniciais de independência, está mais preparada para aceitar a entrada do terceiro, qualquer que seja ele, bem como para respeitar a gradativa busca de autonomia de seu filho, para o resto de sua vida. Elas continuam oferecendo aquelas condições até o momento em que ele atinge o limite de sua tolerância, quando elas retiram as condições que, até então, vinham oferecendo. O quadro de autismo de configuraria, portanto, no instante em que 3

(…) aquelas mulheres que chegam a dar a luz, mas não suportam a própria separação física de seu bebê, imediatamente após o parto, suspendem, drasticamente, a oferta daquelas condições, mesmo que, no plano objetivo, continuem a cuidar do filho, que sobrevive apenas no plano biológico. (LOBO, 1996.)

        Lopes (2005) citando Rogers (1977) diz que este nos ensina que é a partir de uma relação humana dotada de certas condições favoráveis a aceitação de si e ao pleno desenvolvimento que um processo de mudança interna, visceral pode se instaurar. Nesse tipo de relação, deve acontecer um encontro profundo onde me aproximo o mais possível do fluxo experiencial daquela pessoa que ali está, a fim de oferecer-lhe uma compreensão empática desse vivido. Assim, é preciso confiar na sabedoria advinda desse encontro. Lopes ainda precisa o pressuposto para que um trabalho com crianças seja possível:

A criança é uma pessoa em desenvolvimento. Possui em si todos os instrumentos que a possibilita evoluir e desenvolver-se e uma tendência a utilizar tais instrumentos, desde que lhe sejam dadas condições favoráveis para tanto. Estrutura sua identidade na relação afetiva com os adultos de referência. Nos primeiros anos de vida, sua principal via de relação com o outro e experimentação do mundo é basicamente o corpo e a comunicação não-verbal. Diferencia-se do adulto não em status, mas em experiência e consciência de vida, percepção de si mesmo e do mundo. (LOPES, 2005)

Diante dessa sustentação teórica, a idéia do projeto surgiu a partir de vínculo com a música e dos benefícios que ela trouxe em nossa comunicação com o ambiente, com as pessoas e com nós mesmos. Desde que se iniciou a musicalidade em nossas vidas, aprendendo os primeiros acordes de violão, podemos perceber que, além de selecionar músicas em cujas letras havia algum significado singular para nós, também podemos sentir em vários momentos os diferentes tipos de emoções que se manifestavam antes, durante e depois da execução das músicas. A metodologia planejada para aproximação das crianças na Instituição em que o trabalho foi realizado, portanto, foi a musicoterapia.

De acordo com estudos realizados por Isabelle Peretz, neuropsicóloga americana, crianças identificam bem cedo os índices emocionais na estrutura musical, e sua percepção desses índices aumenta durante o desenvolvimento. Nas reações emocionais (medo, alegria, tristeza, por exemplo) o sistema nervoso central reage com aceleração dos batimentos cardíacos ou aumento da transpiração, o que se detecta verificando-se a corrente elétrica sobre a pele.

Katrin Schaller (2005), bióloga e jornalista em Walldorf, Alemanha, diz que a musicoterapia recorre à música a fim de recuperar, manter e estimular a saúde mental 4 de um paciente. Como em todo tratamento psicológico, requer intenso relacionamento terapêutico. Para tanto, o paciente faz uso de sua voz ou de instrumentos fáceis de tocar, com os quais pode-se produzir algum som mesmo sem formação musical. Fazer música simplesmente traz alegria e cria uma ligação positiva entre o paciente e o terapeuta. E tal relacionamento costuma ser decisivo para o sucesso do tratamento. E apenas escutar música também propicia o bem-estar da criança. Para tanto, o terapeuta improvisa com o instrumento preferido do paciente. Essa “musicoterapia receptiva” é utilizada com muito menos freqüência que a produção ativa de música e serve, principalmente, para relaxar o paciente e estimular sua imaginação ou torná-lo mas receptivo às sugestões do terapeuta. Mas como se explica essa eficiência?

Em crianças, a música raramente é associada a algo negativo. Experiências traumáticas são, em geral, ligadas a palavras, não a sons musicais. Portanto, crianças com experiências ruins costumam ter ouvido mais sensível para a música e os terapeutas conseguem se aproximar mais facilmente delas por esse caminho. (SCHALLER, 2005)

        A auto-expressão musical leva quase que naturalmente a outras formas de comunicação. Para isso, normalmente é utilizado o canto, o tocar de instrumentos e a escuta de músicas como meios agradáveis, intermediários e gratificantes de adquirir habilidades de auto-expressão. A música pode incluir palavras, movimentos e imagens visuais, pode ainda enriquecer e ampliar outras formas de comunicação o que fortalece o trabalho paralelo entre a musicoterapia e o atendimento psicoterápico (Brucia 2000). A música tem de se posicionar de forma intercambiável para com o afeto; é como se o afeto que é trazido pelo profissional tivesse que pegar uma carona com a música para se chegar até a estação que é o sujeito.

O objetivo foi estudar o caráter evolutivo do afeto, sociabilidade, responsabilidade, reorganização da estrutura psíquica e linguística, considerando os limites biológicos e psicodinâmicos das crianças observadas. Qualquer que tenha sido a etiologia do desvio da potencialidade do sujeito, seja ela biológica ou psicodinâmica, ao receber de quem quer que seja um ambiente favorável de afeto, o sujeito passa a se re-arranjar perante as dificuldades do ambiente, pois, o afeto em nossa concepção seria o catalizador mestre de qualquer que seja a potencialidade habilidosa que o sujeito traz consigo – seja ela social, lingüística ou dinâmica, pois, nem só de corpo é feito a alma, como nem só de alma se alimenta o corpo. Nossa crença não é nem a de que esses sujeitos percorrerão um itinerário natural depois de receber as condições 5 favoráveis de afeto, mas, que poderão lidar com maior naturalidade com o ambiente hostil de seu itinerário desviante.

A experiência vivenciada com as três crianças da Instituição em Barbacena/MG

– João, Paula e Raquel (nomes fictícios), mostrou o quão eficaz a musicoterapia aliada à nossa crença de desenvolvimento humano pode ser. As três crianças citadas acima possuem (possuíam?) diagnósticos diferentes e não finalizados pela Instituição, mas, são vistas pela mesma como crianças com características autistas. Ao ter contato com diversos estilos de música, pudemos confirmar aquilo que a psicoterapia humanista centrada na pessoa já havia proposto através da linha da linha afetiva da personalidade e da utilização saudável de suas potencialidades.

As habilidades sócio-afetivas, responsivas de caráter linguísitico, psicomotoras e entendimento simbólico do ambiente familiar e institucional mostraram-se bem além do esperado por nós, como nos primeiros esboços de busca de contato afetivo, demonstrados desde o primeiro encontro:

(…) os estagiários estavam sentados em uma bancada, Raquel veio em nossa direção e nós a chamamos para sentar-se ao nosso lado. Quando chegou, colocou uma das mãos no ombro de Renan e sentou-se em seu colo, por onde ficou até a hora de irmos embora. (Relatório de estágio – primeiro encontro. Dia 20/09/2007).

        Alguns esboços de comunicação verbal também foram percebidos, como mostra a passagem abaixo:

(…) em um certo momento o estagiário estava brincando com Raquel onde ela manifestou um som (Ti) o que fez com que os estagiários interpretassem que ela estava querendo falar Thiago, o que não pôde ser comprovado posteriormente. (Relatório de estágio – sexto encontro. Dia 31/10/2007).

        A evolução de João foi mais trabalhosa e nos exigiu mais, desde a retirada do espelho da sala onde eram realizados os encontros até a mudança de ambiente desta mesma sala para o pátio. Neste período em que estamos no pátio, João não está mais agressivo, o que facilitou o segmento do projeto.

No início dos contatos com João, eram comuns suas posições de luta, alta agressividade e este até cuspia em nós, o que acreditamos ser defesas de um contato próximo, já que acreditamos que deve ter havido poucas pessoas dispostas em sua vida a se relacionar verdadeiramente com ele.

(…) João está mais falante e agitado, cada vez mais exibindo-se na frente do espelho, cantando, esfregando as mãos e chamando nossa atenção explicitamente. (Relatório de estágio – terceiro encontro. Dia 10/10/2007).

        O que João dizia parecem ser frases já ditas para ele, como: “vai pro seu lugar João, estou de olho em você”. João refere-se sempre à terceira pessoa, como percebido em outro exemplo: “para de dançar João”. Nossa hipótese é a de um não reconhecimento de si mesmo como pessoa, o que parece ser comprovado com sua extrema agitação ao se ver diante do espelho. No quinto encontro, mudanças efetivas começam a acontecer:

(…) Tirado o espelho, ficou calmo e pareceu não sentir falta do mesmo. Neste encontro tiveram muitos gestos que pareciam gestos afetivos; ele segurava nas mãos dos dois estagiários, beijava nossa testa, uma de nossas mãos e, por fim, as apertava. (Relatório de estágio – quinto encontro. Dia 07/11/2007).

        Um de nossos objetivos também foi o de devolver a autonomia às crianças que acreditamos ter sido retirada (talvez nunca oferecida) já há bastante tempo. No dia em que fomos apresentar o projeto à Instituição, uma das professoras foi buscar uma das crianças com as quais trabalharíamos. Algo nos chamou a atenção quando o nariz de Raquel começou a escorrer e, imediatamente, a professora saiu da sala e voltou com um papel higiênico limpando o nariz da criança. Em outro momento, somente com os estagiários, o nariz escorre novamente e após três avisos de um dos estagiários, a própria criança o limpa. A questão de não ter respondido prontamente ao primeiro aviso nos parece pertinente: por que fazer algo se sempre teve alguém para fazer por ela? Em outro momento, também foi possível perceber como a criança tem condições de atender ao que lhe pedem:

(…) quando entramos na sala, Renan pediu que Raquel se sentasse, e ela logo se sentou em uma cadeira que tinha lá. (Relatório de estágio – quarto encontro. Dia 18/10/2007).

No décimo encontro, realizado em novembro de 2007, nos assustamos, mesmo seguros do vínculo já criado, com a atitude de Raquel:

(…) depois de algum tempo Raquel levantou-se sozinha o que causou espanto nos estagiários, pois, sempre ajudavam-na a se levantar. Ao fechar a sala, Renan a chamou para ir embora umas seis vezes e ela não dava ouvidos até que Renan falou “você só faz as coisas na hora que você tem vontade”. Logo, levantou-se e, então, fomos embora).

        No 2º semestre de trabalho na Instituição, tivemos significativo retorno ao encontrarmos com a diretora da Escola, que nos relatou que Raquel teve uma evolução grande, que estava comendo sozinha e estava mais atenta nas aulas. Paula não apresentou grandes evoluções durante as férias, e em João infelizmente, percebemos perdas significativas.

No decorrer dos encontros seguintes fomos observando as evoluções que foram relatadas pelos professores e diretores de Raquel, que se mostrava mais solta e mais alegre. Paula começou a esboçar palavras e a falar algumas como papai, vovó e estava mais afetiva com nós estagiários. João estava mais agressivo, o que nos preocupou muito e que nos fez procurar outras pessoas que trabalhavam diretamente com as crianças para podermos obter mais informações sobre como eram seus comportamentos com os monitores, o que foi extremamente válido.

Quanto à metodologia da musicoterapia, pensamos que esta ferramenta de trabalho tem seus limites no próprio afeto, quer dizer, aquilo que não é de índole afetiva, a musicoterapia não terá acesso de modo a ajudar o sujeito a se re-arranjar psiquicamente.

A musicoterapia haverá de atuar junto aos seus imites, sejam eles de cunho ambiental, comportamental ou até mesmo inconsciente. Nesse caso a música é a tradução do afeto, e aquilo que de sua ordem for, afetado será.

Uma história também real, representada pelo filme “Meu filho, meu mundo” (EUA, 1979) que fundamenta nosso trabalho é a do casal Barry e Samahria Kaufman, que no início dos anos 70, ouviram dos especialistas que não havia esperança de recuperação para seu filho Raun, diagnosticado com autismo severo e um QI abaixo de 40. Decidiram, porém, acreditar na ilimitada capacidade humana para a cura e o crescimento, e puseram-se à procura de uma maneira de aproximar-se de Raun. Foi a partir da experimentação intuitiva e amorosa com Raun, há cerca de 30 anos atrás, que eles desenvolveram o Programa Son-Rise que hoje é utilizado em todo o mundo. Raun se recuperou de seu autismo após 3 anos e meio de trabalho intensivo com seus pais. Ele continuou a se desenvolver de maneira típica, cursou uma universidade altamente conceituada e agora trabalha no Autism Treatment Center of América, fundado por seus pais em Massachusetts, nos EUA. Desde a recuperação de Raun, milhares de crianças utilizando o Programa Son-Rise têm se desenvolvido muito além das expectativas convencionais, algumas delas apresentado completa recuperação. (Fonte: Site Inspirados pelo autismo)

O Programa Son-Rise é centrado na criança (ou no adulto com autismo). Isto significa que o tratamento parte do desenvolvimento inicial de uma profunda compreensão e genuína apreciação da criança, de como ela se comporta, interage e se comunica, assim como de seus interesses. O Programa Son-Rise descreve isto como o “ir até o mundo da criança”, buscando fazer a ponte entre o mundo 8 convencional e o mundo desta criança em especial. Com esta atitude, o adulto facilitador vê a criança como um ser único e maravilhoso, não como alguém que precisa “ser consertado”, e pergunta-se “como eu posso me relacionar e me comunicar melhor com essa criança?” Quando a criança sente-se segura e aceita por este adulto, maior é a sua receptividade ao convite para interação que o adulto venha a fazer. (Fonte: Site Inspirados pelo autismo)

A visão convencional do autismo é a de uma condição permanente e irreversível. O autismo é visto como uma tragédia e as crianças são vistas como defeituosas e com a necessidade de conserto. As pessoas do Inspired by Autism Consulting (Inspirados pelo Autismo Consultoria) adotam uma perspectiva bem diferente – uma de esperança e crença em possibilidades ilimitadas. Nós temos observado que o autismo não precisa ser uma condição para toda a vida, e que crianças com autismo sentem-se motivadas para aprender e interagir quando são oferecidos a elas ambientes físicos e sociais otimizados. Eles fazem, ainda, uma interessante associação de ações baseadas em crenças:

(…) se adotamos a crença de que o autismo é uma condição permanente e irreversível, esta crença direcionará nossas ações. Guiados por esta crença, faz sentido que não tentemos reverter o autismo, mas apenas administrá-lo. Isto explica o porquê de tantas abordagens de tratamento focarem no manejo de comportamentos e ensino de habilidades básicas de auto-ajuda ao invés de trabalharem com a essência da questão – o desejo por interação social. Esta abordagem do autismo durante os últimos 50 anos tem sustentado a crença original do autismo como sendo irreversível…

Os fundadores do Programa Son-Rise, Barry e Samahria Kaufman, escolheram intencionalmente acreditar em algo diferente em relação ao autismo de seu filho. Eles decidiram acreditar que era possível aproximar-se dele apesar de ser tão introspectivo, e de não possuírem nenhuma “evidência” como suporte para esta crença. Eles decidiram acreditar assim mesmo. As ações que se seguiram após esta decisão formaram as técnicas e atitudes do que hoje é chamado Programa Son-Rise. Os resultados observados por eles ajudaram a fortalecer a crença na reversibilidade do autismo, e eles passaram a trabalhar com outras crianças. Mais uma vez, o ciclo continua. A questão não é saber qual perspectiva está certa, mas qual perspectiva é a mais útil.

Após resultados encontrados no trabalho, pudemos concluir de acordo com Lobo (1996) que todas as doenças psicológicas implicam um bloqueio do processo evolutivo, que decorre da retirada das condições necessárias, tendo, portanto, uma causa única. O que vai determinar, então, o quadro nosológico, será o momento do 9 processo evolutivo em que essas condições forem retiradas. Ao encontrar, de novo, aquelas condições, o indivíduo retoma o seu processo evolutivo, do ponto em que ele estava bloqueado e, assim, continua desenvolvendo em direção a um funcionamento psicológico cada vez mais saudável.

De acordo com Lopes (2005), é a partir das relações afetivas que a criança vai estabelecendo com as pessoas significativas, com os objetos e com o mundo que ela vai constituindo sua forma de existência atual que, conseqüentemente lhe dirá da sua existência quando adulta. Segundo Margareth Mahler (1977), o desenvolvimento psicológico da criança, é o que vai fazer com que ela saia gradativamente de seu mundo interior, de uma relação de dependência e simbiose, para uma relação de autonomia e individuação em direção ao mundo exterior.

Gostaríamos de finalizar com uma citação pessoal de Raun, o garoto recuperado de seu autismo:

Ter esperança apenas ajuda, nunca causa danos, eu não acredito que a esperança possa ser “falsa”. Quando eu fui diagnosticado com autismo de grau severo, meus pais decidiram ver possibilidades onde outros não viam nenhuma saída, e foi essa perspectiva que possibilitou minha recuperação completa (Raun K. Kaufman)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: Bruscia, Kemaeth E – Definindo Musicoterapia – Tradução Marisa Velloso Fernandes Conde – 2 ed, RJ, Enelivros: 2000. LOBO, E.C. Psicopatologia: uma visão humanista. Trabalho apresentado na V Jornada da Clínica de Psicologia da PUC MG (08/10/96) e no IV Encontro Mineiro de Psicologia Humanista (25/10/96). LOPES, J. S. O atendimento à criança: uma proposta Humanista relacional. Palestra apresentada no na Semana de Psicologia do Unicentro Newton Paiva, 2005. MAHLER, Margaret S. O nascimento psicológico da criança. Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1977. MIDGLEY, M – Can’t We Make Moral Judgements? N.Y.:St. Martin’s Press 1991. 10 ROGERS, Carl. R. & KINGET, G. Marian. Psicoterapia e Relações Humanas: teoria e prática da terapia não-diretiva .2a . ed. Belo Horizonte, Interlivros, 1977. CID-10 1993 DSM-IV-TR 2004 Inspirados pelo autismo. Disponível em: Acesso em: 01 Maio. 2008. Bruno de Morais Cury – Psicólogo Clínico e Professor da UNIPAC – Universidade Presidente Antônio Carlos Renan Willian Velho da Silva – Acadêmico do 8º período do curso de Psicologia da UNIPAC – Universidade Presidente Antônio Carlos Thiago de Paiva Campos – Acadêmico do 5º período do curso de Psicologia da UNIPAC – Universidade Presidente Antônio Carlos.

 

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Danilo Suassuna
Danilo Suassuna

Pós doutorando em Educação, Psicoterapeuta há quase 20 anos, é psicólogo, mestre e doutor em Psicologia pela PUC-GO. Especialista em Gestalt-terapia pelo ITGT – GO. Foi professor da PUC-GO e do ITGT-GO entre os anos de 2006 e 2011.

É CEO, membro fundador e professor do Instituto Suassuna (IS-GO) e membro do Conselho Consultivo da Revista da Abordagem Gestáltica: Phenomenological Studies (RAG), além de consultor Ad – hoc da Revista em Psicologia em Revista (PUC-Minas).

É autor dos livros: – Histórias da Gestalt – terapia no Brasil – Um estudo historiográfico – Organizador do livro Renadi: a experiência do plantar em Goiânia – Organizador do livro Supervisão em Gestalt-Terapia, bem como autor de artigos na área da Psicologia.